segunda-feira, 7 de março de 2011

Músicas

Rookmaaker

Palavrantiga

Composição: Marcos Almeida
Rookmaaker
Eu leio Rookmaaker, você Jean Paul Sartre
A cidade foi tomada pelos homens.
Na cidade dos homens tem gente que consegue ler,
mas os outros estão néscios pra Ti.
Eu canto Keith Grenn, você canta o quê?
A cidade está cheia de sons.
Na cidade dos homens tem gente que consegue ouvir,
mas os outros estão surdos pra Ti.
Vem jogando tudo pra fora.
A verdade apressa minha hora.
Vem revela a vida que é nova.
Abre os meus olhos agora.
Eu fico com a escola de Rembrandt você no dadaísmo de Berlim.
A cidade está cheia de tinta.
Na cidade dos homens tem gente que consegue ver,
mas os outros estão cegos pra Ti.
Eu monto o paradoxo no palco. Você anda zombando da Cruz.
A cidade está cheia de atores.
Na cidade dos homens tem gente que consegue dizer,
mas os outros estão mudos pra Ti.
Vem jogando tudo pra fora.

Vem revela a vida que é nova.
Abre os meus olhos agora.
Toda vez que procuro aqui algo pra ler, ouvir, olhar e dizer,
Senhor sabe o que eu quero.
Não me furto a certeza: és a Vida que eu quero.



Hans Rookmaaker

rookmaaker
Através do seu livro Arte não precisa ser justificada ele analisa questões como: o dilema da arte e da cultura, o papel da igreja nesse dilema, a tarefa de artistas cristãos.
Influenciado por outros filósofos holandeses (neo calvinistas) como Abraham Kuyper, que chegou a ser primeiro ministro e era um anti revolucionário e Herman Dooyeweerd, ele defendia que a arte e a cultura são dádivas divinas e que mais cristãos deveriam se envolver nessas atividades.
Um pensamento de Schaeffer colocado na página de Labri expressa essa mentalidade:
"Art is a feflection of God's creativity, an evidence that we are made in the image of God".
(Arte é um reflexo da criatividade de Deus, uma evidência de que somos criados à imagem de Deus).
Hanz Rookmaaker costumava dizer que deveríamos questionar toda e qualquer obra artística com as seguintes perguntas: “Ela é boa tecnicamente?”, “Tem integridade?”, “É verdadeira?” (Steve Turner em entrevista para Cristianismo Criativo).
Sem dúvida esse pensamento deve ter representado uma avanço na época, pois houve um tempo em que expressões artísticas não eram bem vistas em igrejas evangélicas e os fiéis eram levados a evitar todo tipo de arte secular.
Voltando à morte da razão, podemos concluir que uma grande preocupação de Schaeffer neste livro era justamente trazer os crentes para dentro de um mundo dos quais eles haviam se alienado: o mundo artístico.


Palavrantiga: arte sem rótulo cristão

Luzes no palco, rock em alto volume e uma multidão de braços erguidos, em balanço sincronizado e sorriso aberto. No microfone ao centro, um jovem barbudo de cabelos cacheados empunha uma guitarra, cambaleia pelas melodias como um equilibrista bêbado, enquanto outros três amigos guiam com segurança o ritmo que faz bater o pé dos ouvintes mais contidos.

As camisetas estampam mensagens de atitude, denunciam a fé e o vigor juvenil dos integrantes do Palavrantiga. "Feito de barro", exibe discretamente no peito o vocalista Marcos Almeida, enquanto espalha sua feliz mensagem de esperança em melodias melancólicas. É noite de sexta-feira e, ao meu lado, centenas de homens e mulheres acompanham cada verso a plenos pulmões.

A cena toda ocorre dentro da igreja Missão Praia da Costa, em Vila Velha (ES). Ao fim do espetáculo - que em nenhum momento deixa de parecer um culto - me identifico, conheço de perto os integrantes da banda, sou lembrado pela sincera crítica feita ao disco - da qual pude me explicar mais tarde -, e combinamos um almoço para o dia seguinte. Cantarolando as músicas novas que embalaram a noite, volto para casa e espero o horário marcado.






Arte cristã?

Mineiros e capixabas estão reunidos em uma longa mesa e, entre um pedaço e outro de picanha, começo a entender um pouco mais da cosmovisão - termo frequente no vocabulário de Marcos - que rege as letras da banda. Depois de algumas horas compartilhando experiências, sou informado que o Palavra - nome carinhoso com o qual se referem ao grupo - foi convidado para abrir um  show em São Paulo.

O rapper brasileiro, emergente na cena do hip hop, recentemente foi pauta de grandes revistas nacionais (veja ótima entrevista concedida a Pedro Alexandre Sanchez para a Bravo!"Dizem que os caras da Rolling Stone vão estar lá. Já pensou, cara?", sonha o vocalista. Na rápida conversa que sucede a novidade, fica evidente o feito alcançado pela banda: mais uma vez, romperam o circuito cristão e alcançaram notoriedade além do rótulo que os persegue.

Por sinal, rótulo este rejeitado com veemência. "Quem acompanha o Palavrantiga não está desenganado a respeito da gente. Primeiro que a gente não é uma banda com fins religiosos. Todo mundo sabe disso. Alguns chamam a gente de gospel, outros de cristãos, mas a gente nunca denominou o Palavrantiga com estes termos. Isto é coisa que outros estão dizendo a respeito da gente. A gente enxerga o mundo de forma muito mais simples, embora outros possam enxergar de forma complicada", justifica Marcos.
"Tem muita gente ganhando mídia, palanque e espaço na internet, nas novas mídias, batendo no meio evangélico mas sem propor ou criar um novo pensamento. Não se propõe nada, o máximo que tentam é chamarem a si mesmos de criativos, inteligentes. Aí eu pergunto: 'mas o que você propôs, brother? Você ainda faz divisão do mundo em sacro e profano, só é um pouquinho mais sofisticado, usando um vocabulário diferente'" (Marcos)
Este "enxergar de forma complicada", citado pelo vocalista, se estende à igreja, aos meios de comunicação e, por que não?, aos artistas cristãos. "O que valida, fundamenta, justifica o fato de fazer música? Se for outra coisa a não ser arte, você a está subjugando a outra esfera, que talvez pode diminuí-la. O que algumas pessoas fazem é se esconder dentro de um argumento eclesiológico, um argumento da esfera pística, [para entender mais sobre o conceito, leia aqui, por indicação de Marcos] religiosa, pra validar seu trabalho de artista, sendo que são esferas interdependentes", explica.

Unção x Qualidade

Almoço terminado, seguimos para mais uma rodada de perguntas, desta vez, na casa do baterista Lucas Fonseca. Acomodados na sala, conversamos mais um pouco sobre os rumos da música cristã. Ponho em xeque a postura de alguns artistas, que insistem em comercializar músicas rasas sob o pretexto de serem "cheios de unção" - parâmetro imprescindível, tendo em vista que todo cristão possui o Espírito Santo como guia. Marcos responde.

"Não é porque você tem fé que a sua canção é válida. Pode fazer uma canção que é uma porcaria, horrível. Existe o belo e o feio. E tem gente que pode fazer uma canção feia e ter unção. Entendeu? Mas aí é o seguinte: o que você vai estar avaliando quando o brother está compartilhando a música dele? No contexto religioso, da igreja, o importante ainda é a mensagem, a unção, porque a igreja ainda não criou um espaço para apreciar", resume.
  • Você sabia?
  • Os integrantes se conheceram enquanto faziam turnê como banda de apoio de Heloísa Rosa, conhecida por ministrar com David Quinlan
  • Marcos, que era tecladista de Heloísa, se juntou a Lucas, Felipe e Josias apenas em 2008 como Palavrantiga
  • Neste curto período, o Palavrantiga foi convidado pelo tecladista do Skank, Henrique Portugal, para tocar em eventos de bandas alternativas
  • O grupo é um dos destaques do Oi Novo Som!, projeto da Oi FM para divulgar novas bandas brasileiras
Fora da igreja, porém, se faz necessário abrir espaço para a apreciação, concordam os integrantes da banda. Lucas defende o fim da "poda artística" dentro das igrejas, ambientes onde a expressão deve sempre estar vinculada à devoção. O baterista hierarquiza três pontos que considera fundamentais para a boa arte, citando um crítico holandês, Rookmaker. "Primeiro, a qualidade dela [da arte], a técnica; segundo, se ela tinha uma verdade, se não era uma coisa reducionista, distorcida; e terceiro, a integralidade da arte. São três pontos que o cara sempre falava: "nem toda a arte cristã tem isso, e muita coisa do meio tradicional artístico se encaixa nestes pontos", lembra. [A banda sugeriu o áudio de uma palestra de Rodolfo Amorim, na qual disserta sobre o crítico holandês. Ouça aqui]

Igreja

Para Marcos Almeida, a discussão envolvendo rótulos, qualidade e unção tem sido feita no ambiente errado. A igreja, segundo classifica, continua sendo o lugar para apenas "acolher pessoas e ensinar o evangelho". Torná-la um ambiente para debates, diluindo sua função principal, "é dar à esfera pística, uma coisa que não é da alçada dela", lamenta.

Em meio à profundidade dos temas discutidos, é inevitável não perceber quão bem embasados estão todos os membros do Palavrantiga. Parte disso, deve-se à biblioteca transportada durante as viagens da mini-turnê. Ao invés de discos e música em alto volume - como vemos nos filmes -, livros e silêncio estão por toda a parte. Obras de CS Lewis, John Stott, e outros que não consegui discernir (por culpa do inglês com sotaque mineiro do vocalista) deixam para trás o esteriótipo de que bandas de rock e literatura não combinam.


Nada é Impossível

Pregador Luo

Composição: Pregador Luo e Chorão
Com os olhos de quem quer ter uma oportunidade
Com os olhos de quem quer ter uma vida de verdade
É assim que eu olho, é assim eu vejo...
Grande eu penso, grande almejo...
Quem ousou conquistar e saiu pra lutar, chega mais longe
Tem gente que nem quis tentar, multiplica seus talentos
Não enterra não, se não na hora da verdade vai ser mó decepção
Tem que correr, tem que superar
pode doer, não vou brecar...
Minha ordem e progresso deixa que eu mesmo faço
Boto o pé em Jah e força no meus braços
As muralhas que eu puder eu mesmo derrubo
aquelas que não der, Deus põe no chão pra mim
sem preconceito, nem racismo, nem inveja, nada me pára antes do fim
nem olho gordo, nem conspiração, patifaria bate na minha porta e cai no chão
Eu chuto pra longe toda a má vibração...
Eu sou mais que vencedor
Nada nessa vida é impossível pra mim
Eu nasci pra conquistar
Nada nessa vida é impossível pra mim
Nada,nada nessa vida é impossível pra mim
O Impossível é uma palavra muito grande
que gente pequena usa pra tentar nos oprimir
O Impossível é uma palavra muito grande
que gente pequena usa pra tentar te oprimir
Mas a vida ensina, sou eu sei o que passei
A vida não é fácil, mas eu tô ligado, eu sei,
eu sigo o meu caminho, tô firmão, tô aí!
Não há nada nessa vida que me faça desistir
São várias fitas só segura quem é nobre,
força de vontade, pensamento forte...
Erga a mão pro alto e faça diferença,
fique sempre em paz com a sua consciência...
No caminho certo, em direção ao futuro
cantando com alma e sentimento puro,
música e cultura pra fugir da miséria,
uma das poucas opções por aqui a coisa é séria...
com isqueiro maçarico eu vou deixar a chapa quente
tenho fé em Deus, e o poder da minha mente,
a mil e miliano tamo aí virando a mesa
Carta na manga com o elemento surpresa...
Se disseram pra você que você não vai conseguir
Deixa pra lá, deixa falar, deixa sorrir
Já disseram isso pra mim e hoje eu tô com o microfone
por que a vida dá caminho pro sujeito homem!
O Impossível é uma palavra muito grande
que gente pequena usa pra tentar nos oprimir
O Impossível é uma palavra muito grande
que gente pequena usa pra tentar te oprimir
Mas a vida ensina, sou eu sei o que passei
A vida não é fácil, mas eu tô ligado, eu sei,
eu sigo o meu caminho, tô firmão, tô aí!
Não há nada nessa vida que me faça desistir
São várias fitas só segura quem é nobre,
força de vontade, pensamento forte...
Erga a mão pro alto e faça diferença,
fique sempre em paz com a sua consciência...
No ring, na pista ou na vida
eu sou especialista, "nóis" aqui não brinca
só espartano que não foge no bang
então cola com "nóis" e aumenta a gang (2x)
Bang, bang, bang, bang
cola com "nóis" e aumenta a gang
Quem melhor?
Do que quem levou na pele
pra poder falar pro povo que ainda há uma solução?
Quem melhor?
Do que nossa gente unida
pra estancar essa ferida da discriminação?
Quem melhor?
Do que os filhos da miséria
no farol a sua espera pra te deixar sobre tensão?
Quem melhor?
Que o quê? O quê?

Leia a íntegra da entrevista que Rodolfo, ex-Raimundos, deu à Folha

AUGUSTO PINHEIRO
da Folha de S. Paulo

Rodolfo Abrantes, 28, vocalista do extinto Raimundos, falou com a Folha por telefone do litoral de Santa Catarina, onde estava de férias. Leia a seguir a íntegra da entrevista.

Rodolfo - Antes de tudo, muito obrigado por me dar oportunidade de dar minha versão. Ninguém me perguntou nada. Você reparou que tudo o que saiu a nosso respeito [Raimundos] não tinha nenhuma declaração minha. Foi dito muito a meu respeito. Só faltaram dizer que eu ia pra Lua e por isso eu não podia mais ficar no Raimundos.

Folha - A versão que corre é que você saiu da banda por causa da conversão à igreja Sara Nossa Terra. Qual é a verdade?
Rodolfo -
Eu vou te dizer a verdade. Primeiro, a Sara Nossa Terra é uma das igrejas que eu frequento. E não é de ontem. Eu sou temente a Deus desde que eu nasci. Há mais de três anos eu tenho uma tatuagem na nuca que diz "Obrigado, Senhor". Desde o primeiro show que o Raimundos fez, eu oro muito pedindo a Deus proteção. Deus foi muito presente na minha vida sempre. O que deu a entender é que, como a matéria da Sara Nossa Terra saiu falando que eu frequentava na mesma semana que eu disse que saía dos Raimundos, o pessoal associou uma coisa a outra.

Folha - E há quanto tempo você frequenta a Sara Nossa Terra?
Rodolfo -
Cara, eu fui algumas vezes à Sara. Eu me converti mesmo em janeiro deste ano. Já faz bastante tempo, já faz quase um ano. Tipo, eu vou a outra. A minha igreja mesmo é uma pentecostal. É bem pequenina, é tranquila.

Folha - Em Brasília?
Rodolfo -
Não, em São Paulo.

Folha - E qual foi o motivo da saída da banda?
Rodolfo -
Eu saí da banda porque há muito tempo, há muito tempo mesmo, coisa de vários anos atrás, eu tenho necessidade de... O Raimundos era uma banda de hardcore, que era contra o sistema. A gente era contra isso tudo. Eu via a galera na TV fazendo playback, eu tinha nojo. Eu via bandas aí da mídia perdendo sua ideologia por sucesso e eu achava isso horrível. Quando eu vi, o Raimundos virou isso. Sabe como é que é? Tipo foi a banda que fazia cover do Ramones, que se amarrava em Dead Kennedys. A gente tocava em qualquer lugar o som mais sujo que tinha, pra banda tocar "Reggae do Manêro"... "Reggae do Manêro".

Folha - Quem compôs essa faixa?
Rodolfo -
Fui eu, mas foi há cinco anos. A gente nem lançou em disco nenhum, de tão avacalhada que a música era. A gravadora decidiu colocar como música de trabalho.

Folha - Do último disco?
Rodolfo -
A música foi gravada na época do "Lapadas do Povo". Há três discos atrás.

Folha - E você não gosta da música?
Rodolfo -
Ah, eu achava engraçada. Mas uma coisa engraçada não significa que ela tem que ser uma música de trabalho. Isso é pra quem está pensando em dinheiro.

Folha - Por que ela entrou no repertório?
Rodolfo -
Não ia acontecer nada com a música, a gente resolveu colocar ela no disco de brincadeira. É um disco ao vivo. Tem quarenta e tantas músicas legais. A gravadora não tinha nada que querer um reggae horroroso pra ser música de trabalho.

Folha - Isso, então, tem a ver com a sua saída...
Rodolfo -
Não, não foi isso. O motivo foi insatisfação. Eu vejo que a gente tinha muito espaço e eu não estava dizendo nada para as pessoas. Sabe, eu tenho necessidade de fazer hardcore mesmo. É o ritmo de que eu gosto, mas eu quero dizer alguma coisa legal. A gente tinha um espaço tão grande e a gente não usava ele pra nada. Falava de "papel pra cagar". A música tocando mil vezes na rádio falando a maior besteira do mundo.

Folha - Mas você era o letrista da banda. Por que você não escrevia sobre outros assuntos?
Rodolfo -
Aí é que eu te explico. O Raimundos, quando começou, era uma brincadeira. Era uma brincadeira. Quando o Raimundos começou, eu tinha a minha banda, em que eu era guitarrista, que se chamava Royal Street Flash, em que a gente tocava um som pauleira, que tinha as letras legais. O Digão tinha a banda dele, chamada Filhos de Mengheli, que era uma banda punk, tinha letras de protesto. O Raimundo era uma brincadeira. Era quando a gente se juntava, fazia cover, tocava música de forró. A gente brincava. A brincadeira cresceu, a brincadeira ficou famosa, a brincadeira deu dinheiro e a brincadeira ganhou espaço. Mas eu estou me vendo na situação que eu estou, sacou? A minha vida está passando. Eu não quero levar a minha vida na brincadeira, eu não sou dos Trapalhões.

Folha - Mas por que você não tentou mudar isso na banda, escrever outras letras?
Rodolfo -
Porque o Raimundos era aquilo. Não dava pra fazer do Raimundos uma banda séria. O Raimundos não era uma banda... Apesar de ter várias músicas legais, como "Deixa Eu Falar", "Baile Funk", não era uma banda para ser uma banda séria.

Folha - E você não estava feliz?
Rodolfo -
Não estava feliz. Exatamente. Eu não estava feliz na banda, não estava feliz com o que eu cantava, eu não estava feliz com o que eu fazia. Acho que isso é de extrema importância. Uma coisa que me fez me tocar muito, cara, foi aquela música "20 e Poucos Anos", que a gente gravou, do Fábio Jr. Se puder, por favor, eu te peço por favor, porque você está me dando oportunidade de falar o que eu penso, coloca a letra dessa música aí na matéria.

Leia aqui a letra da música "20 e Poucos Anos"

Folha - Qual é a parte da letra que lhe toca mais?
Rodolfo -
Pode colocar a letra inteira, que a letra inteira é excelente. O Fábio Jr. mandou muito bem. Essa música diz tudo.

Folha - Em janeiro, você se converteu para qual igreja, a Sara?
Rodolfo -
Cara, eu me converti a cristão, eu sou de Deus. Eu não me ligo a placa de igreja. Eu sou evangélico. Eu leio a Bíblia, eu sigo a Bíblia.

Folha - Antes você era católico?
Rodolfo -
Não, eu não era nada. Antes eu só temia a Deus, mas eu não seguia.

Folha - A conversão influenciou de alguma maneira no seu modo de pensar e isso, de repente, influenciou também a sua decisão?
Rodolfo -
Não, de forma alguma. Religião... Estar com Deus no coração só me fez bem na vida. Eu consegui largar as drogas. Consegui ser feliz de verdade.

Folha - Então, você largou as drogas depois que entrou na igreja?
Rodolfo -
Foi. Quando eu tive Deus no coração foi isso. É importante frisar que eu não estou fazendo propaganda de igreja, eu sigo Deus, Deus.

Folha - Que drogas você usava?
Rodolfo -
Cara, eu fumava maconha desde os 13 anos de idade. Eu tenho 28. Eu passei mais da metade da minha vida fumando. Isso me fez muito mal. Muito mal. Tanto psicológica quanto fisicamente.

Folha - E o que mais mudou na sua vida depois da conversão?
Rodolfo -
Coisa simples. Eu sou sadio. Eu tenho a mente sadia. Eu sou feliz. Isso para mim é tudo.

Folha - Você passou a considerar as músicas dos Raimundos ofensivas?
Rodolfo -
Não, eu não me arrependo de nada. Acho que o Raimundos era uma brincadeira, que devia ser tratada como tal. Mas é aquele negócio. O Raimundos deu dinheiro, então muita gente levou isso muito a sério. Eu quero usar desse dom que Deus me deu de compor pra falar alguma coisa legal pras pessoas. Como a "20 e Poucos Anos" me tocou profundamente, eu quero fazer letras que digam alguma coisa de bom pras pessoas mesmo.

Folha - Quais são seus planos?
Rodolfo -
O que eu faço: tocar. Vou tocar. Eu estou fazendo várias músicas. É tudo hardcore, eu gosto de hardcore. É o estilo que eu gosto, que eu vou fazer. Eu estou precisando fazer uma coisa séria desta vez, uma coisa que diga...

Folha - As letras vão falar do quê?
Rodolfo -
Falar de coisas reais. Do que eu sinto. Eu não sei.

Folha - De Deus?
Rodolfo -
Cara, eu não sou cantor evangélico. Esquece isso que você ouviu a semana inteira. Isso é uma busca minha. Eu sempre fui temente a Deus. Você pode pegar qualquer encarte do Raimundos, pode colocar isso, por favor, também que isso é bem importante. Na lista de agradecimentos, desde o primeiro disco, eu agradeço a Deus primeiro. Sempre fui temente a Deus. Deus sempre só me deu força.

Folha - Há quanto tempo você tinha pretensão de deixar a banda?
Rodolfo -
Desde 96, eu já tinha vontade de fazer alguma coisa diferente, mas eu não tinha coragem. Eu falava, que é isso, largar tudo, você tá doido?, não-sei-o-quê, mas isso se tornou uma prioridade na minha vida. Eu prefiro fazer isso pra ser feliz. Se eu ficasse no Raimundos, eu não ia estar feliz lá. Eu não ia render nada infeliz na banda.

Folha - E o que te impedia de sair?
Rodolfo -
Quando eu pensava nisso, eu fumava um baseado e achava que estava tudo bem e não tomava nenhuma atitude. Este ano, quando eu consegui largar, eu comecei a ver as coisas como elas eram. Ver o que realmente me fazia bem e o que realmente não fazia bem. É uma necessidade que eu tinha... Eu não me arrependo do Raimundos, de forma alguma, eu não renego o Raimundos. Mas eu tenho necessidade de fazer uma coisa minha. Que diga coisas que eu me orgulhe de estar dizendo.

Folha - O que, por exemplo?
Rodolfo -
Qualquer coisa que faça as pessoas pensarem. Eu quero coisas que dêem idéias reais, sabe? Músicas novas, eu não sei como vai ser, eu ainda não escrevi, eu não penso assim de... vou escrever sobre isso e escrevo. A inspiração vem. Tenho que dar espaço pra isso. Pra usar desse talento que Deus me deu pra eu falar alguma coisa de bom para as pessoas.

Folha - E o que fez você concretizar a decisão da saída?
Rodolfo -
Eu refleti. Eu passei a refletir durante os shows.

Folha - Foi também o fato de ter largado as drogas?
Rodolfo -
Também. Também e não. Acho que não tem muito a ver. Não tem nada a ver porque, por exemplo, o Fred nunca usou nada e tocava no Raimundos.

Folha - Você disse que, quando pensava em sair, fumava um baseado e esquecia...
Rodolfo -
Esquecia. De repente, eu comecei a ver que eu tinha saudade dos meus amigos, da banda mesmo. Estava cada um para um lado. A gente só se encontrava na hora do show. Eu falava "cara, uma banda não é assim". Eu pensava direito, a banda é mais amizade que qualquer outra coisa. É muita cumplicidade. E isso a gente resgatou. Foi muito bom que, depois de essa bomba estourar agora, deu pra ver que a gente é bem amigo ainda.

Folha - Como estava o relacionamento antes de você sair e como está agora?
Rodolfo -
Antes, a gente só se via na hora de tocar. Essa é a verdade.

Folha - Havia atritos, brigas?
Rodolfo -
Não, a gente não estava brigando nada. Estava muito bem. Cada um com a sua vida. Mas estava aquela coisa. Não tinha alma, parecia que não tinha alma o negócio. Acho que banda é mais que isso. Eu quero fazer uma coisa minha. Não quero nunca mais ter que pisar em um programa de playback porque a gravadora acha que é legal e porque a galera concorda. Eu não me sinto bem, eu não gosto, eu nunca mais vou. É uma coisa que eu só posso impor a mim mesmo. Não posso impor aos outros. As minhas vontades só posso impor a mim mesmo. Quando eu estou dividindo uma coisa com os outros, eu tenho que ouvir todo mundo e fazer o que a maioria acha que é o certo. Isso muitas vezes vai de encontro ao que eu penso. Então, se eu quero fazer uma coisa que eu esteja 100% de acordo com o que eu faço, eu tenho que fazer eu mesmo. Eu preciso tocar as minhas músicas do jeito que eu penso, quer as pessoas concordem ou não. Eu que vou estar fazendo, eu que tenho que concordar.

Folha - Como você comunicou que iria deixar a banda aos outros integrantes?
Rodolfo -
Ia acabar a turnê. Terminou a turnê. A gente tinha algumas entrevistas para dar a respeito do DVD. Foi a oportunidade de encontrar os quatro na gravadora. Eu cheguei, já entrei na sala e falei: "Ó, tô saindo". E a gente conversou como a gente nunca mais tinha conversado.

Folha - Que explicação você deu?
Rodolfo -
Falei que estava saindo porque eu preciso fazer outras coisas. Preciso fazer outras músicas diferentes para a minha felicidade.

Folha - Qual a foi a reação deles?
Rodolfo -
Cara, eles ficaram doidos. E, como a gente não conversava há muito tempo, eles começaram a perguntar "pô, você está estranho há muito tempo, o que foi que aconteceu?". Aí que foram perguntar da minha igreja. Aí que a gente foi conversar a respeito disso, quando eu dei a notícia. Então, ninguém tava preparado e amontoou muita coisa. A notícia de que eu estava na igreja saiu na mesma semana que eu dei a notícia de que saí da banda. Então, as pessoas associaram uma coisa a outra. Cara, põe aí, não tem nada a ver.

Folha - Então, eles ficaram chocados?
Rodolfo -
Sei lá, acho que a cabeça de cada um foi prum lado.

Folha - Porque eles não queriam acabar com a banda...
Rodolfo -
O Fred achava que isso já estava meio pra acontecer, mas querer eu acho que ninguém queria. Eu não queria também que a banda terminasse, eu queria sair.

Folha - Ficaram chateados com você?
Rodolfo -
Acho que chateados não. Eles me respeitaram. Eles são meus amigos.

Folha - Como foi na hora?
Rodolfo -
A gente não discutiu. Eu estava falando e a gente conversou mais sobre a vida. A gente tinha tanto tempo que não conversava que a gente conversou sobre várias coisas. A gente ainda tem que conversar muito. Tentar acertar tudo.

Folha - O fato de ter saído no auge do sucesso da banda não pesou na sua decisão?
Rodolfo -
Cara, eu prefiro sair no auge do que sair no fracasso, sair como vencedor. É melhor, né? É uma coisa que aconteceu agora porque tinha que acontecer, não aconteceu ontem porque não tinha que acontecer.

Folha - Que mensagem você deixa para os fãs?
Rodolfo -
O Raimundos continua amigo. Isso é o mais importante. Era a época que unia a gente. E aí é isso que a gente vai continuar sendo sempre. Eu sou músico, eu vou continuar fazendo música, porque eu gosto de tocar hardcore. Também gosto de hip hop, posso fazer o que quiser. Porque eu tenho finalmente liberdade pra isso. Eu vou continuar compondo, vou continuar fazendo música, vou continuar lançando disco. Acredito que o Digão também vá fazer isso, o Canisso também.

Folha - E atualmente como está a relação com eles?
Rodolfo -
Para quem não se falava nunca, o Digão eu falei hoje mesmo, o Fred eu falei hoje também, o Canisso eu tenho falado. O Canisso eu queria deixar inclusive... Dizer que ele é um grande amigo meu, porque, quando tudo isso estourou, ele foi o único que foi à imprensa me defender.

Folha - E vocês têm falado sobre o quê?
Rodolfo -
A gente conversa. O Digão ligou para perguntar como é que eu tava. Isso é muito bom.

Folha - Mas você acha que eles têm esperança de que você volte?
Rodolfo -
Acho que não. Eu deixei bem claro que eu saí. Não foi uma decisão de ontem, eu não tomei de uma hora pra outra. Foi uma coisa que vem se desenvolvendo há muito tempo, muito tempo. E simplesmente chegou a um ponto em que eu não tinha mais como ser.

Folha - Que tipo de reação tiveram os amigos, familiares e outros músicos?
Rodolfo -
As opiniões que eu ouvi, escritas e ditas, foram todas baseadas nas mentiras que disseram na imprensa.

Folha - Alguém te ligou de outras bandas?
Rodolfo -
O Chorão [Charlie Brown Jr.] me ligou. Falou cara tu é meu amigo, vocês são a banda que eu mais gostava, pode contar sempre comigo, a gente sempre vai ser amigo. Achei isso muito bom. O Alfa, do Rumbora, também me ligou. Ele me ligou meio sem entender nada porque a gente se conhece há muito tempo. Eu conheço o Alf desde que eu tenho 13 anos. E a gente se conheceu tocando. Pra ele, deve ter sido meio difícil ver uma banda que ele viu começar de tanto tempo, teve influência na vida dele, estar acabando. Mas eu deixei bem claro que eu estava feliz, que eu estava continuando uma coisa boa. É legal ver essa preocupação dos amigos. Nessa horas, é que a gente vê quem são os amigos de verdade. E esses caras foram muito legais comigo. Me deram conforto, falaram "ó, meu irmão, a gente é amigo, a gente vai estar sempre junto."

Folha - E a tua família?
Rodolfo -
A minha família ficou meio revoltada com o que falaram na imprensa porque eles sabiam que eu não tinha nada a ver com aquilo. E a imprensa toda caiu em cima, ligando lá em casa o dia inteiro, uma pressão em cima dos meus pais, e eles estavam sem entender nada. E, por mais que eu falasse, eles viam escrito no jornal outra coisa. Então, eles ficaram meio assim... Depois de muita conversa, eles estão tranquilos, estão bem felizes, minha mãe está bem feliz. Amo muito meus pais e, graças a Deus, eles estão sempre comigo. Meu irmão também.

Folha - E você está casado?
Rodolfo -
Ainda não.

Folha - Você tem um filho...
Rodolfo -
Mora em Brasília, tem 9 anos e se chama Pablo.

Folha - Não frequenta só a Sara Nossa Terra?
Rodolfo -
Não, cara, a minha relação com Deus é com a Bíblia.

Folha - Mas você disse que frequenta algumas igrejas...
Rodolfo -
Frequento várias.

Folha - Quais?
Rodolfo -
Por exemplo, aqui em Camboriú, eu fui à Assembléia de Deus, eu vou ouvir a palavra. É muito bom, é confortante.

Folha - Mas não há diferenças?
Rodolfo -
Tem várias, mas a palavra é a mesma. A Bíblia é uma só.

Folha - Você acredita que Jesus vai voltar para "sarar a terra"?
Rodolfo -
Acredito, cara, o mundo todo acredita. A gente está no ano 2001 por quê? Porque faz 2001 anos que Jesus veio. Deus é tão presente na nossa vida e a gente não consegue enxergar isso. As pessoas tentam fechar os olhos porque acham que viver em Cristo é um sacrifício. Você tem que abrir mão das suas coisas. E não tem nada a ver. A vida em Jesus é liberdade total. Seja livre. Viva sua vida de uma maneira correta que você é livre.

Folha - Tem uma versão também que diz que você interpretou os acidentes envolvendo Marcelo Yuka, Herbert Vianna e Marcelo Fromer como "sinais divinos" para que você deixasse a banda...
Rodolfo -
Essa eu nunca tinha ouvido. Foi a primeira vez que eu ouvi, agora. Nossa, que loucura. Essa foi a mais louca que eu já ouvi. Eu acredito que eles são super-homens, porque eu não conheço ninguém que levou cinco tiros a queima-roupa e está vivo. Não conheço ninguém que caiu de avião e está vivo. Eles são super-homens. Admiro muito eles, eles são excelentes compositores. A influência que eles têm na minha vida é uma coisa de resistência e muito amor à vida. E estão vivos por causa disso.

Folha - Então, não tem nada a ver?
Rodolfo -
Que é que é isso. Nunca ouvi falar disso. Essa foi a primeira vez que eu ouvi essa versão. Meu irmão, é cada absurdo que não dá para entender. É cada coisa... O pessoal associou uma coisa a outra e ninguém nem ligou pra perguntar. Porque, se me ligassem, eu ia desmentir, e aí ia acabar com a manchete. Pô, vender jornal é uma beleza. A mídia tem que ser responsável com as coisas que diz. Eu te agradeço muito por estar me ouvindo.

Folha - Você engordou?
Rodolfo -
Bastante. Felizmente, eu estou sarado. No ano passado, eu estava magro, acabado, triste, doente, horroroso. Tava com 63 quilos, eu estou com 78. Não mudei nada, não. O pessoal tá achando que eu tomei bomba, inclusive. Não estou gordo, de barrigudo, simplesmente estou sadio.

Folha - O que provocou isso?
Rodolfo -
A minha mudança de estilo de vida, de não me drogar mais, de viver correto, de ter Deus na minha vida. Isso tudo influencia para o bem. Vou para Garopaba, vou seguir de carro pra pegar onda. No momento estou de férias, ó velho.

Folha - Você já entrou em contato com gravadora?
Rodolfo -
Não, ainda não, estou de férias.

Folha - Até quando?
Rodolfo -
Vendo que não tenho o que fazer ainda, até eu decretar.

Folha - E você está pegando onda? Está tirando para surfar?
Rodolfo -
Tô e tô tocando bastante. Tô fazendo um monte de música aqui, está saindo um monte de coisa legal.

Folha - Não tem nenhuma letra que você possa adiantar?
Rodolfo -
Não, mesmo que eu tivesse, eu não faria. Me desculpa, não é por nada não, mas é porque eu tenho que guardar. Na hora que sair uma coisa, vai sair de uma vez só.

Folha - Não tem nenhum tema que você pode adiantar para a gente?
Rodolfo -
Renovação. Não ter medo de mudar. Aquela música "20 e Poucos Anos" diz tudo. O cara foi muito feliz quando fez aquela letra. Não ter medo de começar de novo, de começar de um jeito que te faça bem, de ser feliz mesmo. É isso aí, véio.

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