quinta-feira, 1 de maio de 2014

As várias Canções do Exílio




Parodiar a Canção do exílio, de Gonçalves Dias, tornou-se aos poucos uma conduta literária. Os poetas Oswald de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes e José Paulo Paes, entre outros, serviram-se desse poema, para, a partir da matriz romântica, fazer uma espécie de desvelamento do país. O nativismo de outrora desaparece em meio ao olhar crítico, que, a cada novo momento, apanha uma faceta do Brasil e, ao mesmo tempo, reavalia um ponto de vista. Oswald não des­merece a riqueza nacional, “Minha terra tem mais ouro/ Minha terra tem mais terra” (Canto do regresso à pátria), porém, remete-se a ela lembran­do-se também dos que a manusearam em benefício de poucos: “Minha terra tem palmares”. A astúcia de Oswald é admirável. Ele encontra con­vivendo ao lado da riqueza natural (“palmeiras”) a dor e a miséria que marcam a escravidão (“palmares”). No entanto, o poeta não deixa de ser também inocente. Ao reavivar o estigma da escravidão, Oswald desmisti­fica, de um lado, os atrativos e as benesses do solo pátrio, de outro, entre­tanto, parece retomar a inocência de antes, na medida em que mistifica a modernização11. Ao final do poema é feita uma espécie de súplica:
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
José Paulo Paes, por sua vez, valoriza em sua versão o entredito. Diferente do momento histórico do poeta modernista, o terreno sobre o qual José Paulo se desloca pode ser considerado minado. A dificuldade de se impor às claras contra a ditadura o obriga a ser um homem de meias palavras. Mas são murmúrios que dizem muito dos apuros do cotidiano. O sussurro e a elipse são reveladores do sistema de opressão. O poema Canção de exílio facilitada limita a conversa ao mínimo, e o mínimo faz as palavras se encherem de significado:
lá?
ah!
sabiá…
papá…
maná…

sofá…
sinhá…
cá?
bah!
Embora o pano de fundo se mantenha, a versão de Cacaso é mais lúdica, mais irônica e menos elíptica, o humor lhe serve de instrumento para abordar a tensão e os dilemas que faziam do cotidiano uma zona de combate (ainda que nesse combate não pudesse ser incluída a maioria dos brasileiros). O poema resume em sua trajetória (as alamedas são muitas e variadas entre si) um modo de ver o Brasil que pode ser visualizado do ponto de vista romântico, bem-humorado ou lúdico e, ao mesmo tempo, desencantado. Caminha-se, assim, das belezas às mazelas nacionais:
Jogos florais12
I
Minha terra tem palmeiras
onde canta o tico-tico.
Enquanto isso o sabiá
vive comendo o meu fubá.
Ficou moderno o Brasil
ficou moderno o milagre:
a água já não vira vinho
vira direto vinagre.
II
Minha terra tem Palmares
memória cala-te já.
Peço licença poética
Belém capital Pará.
Bem, meus prezados senhores
dado o avançado da hora
errata e efeitos do vinho
o poeta sai de fininho.
(será mesmo com 2 esses
que se escreve paçarinho?)

temos a impressão de avistar em Jogos florais um pouco da nostalgia da Canção do exílio: a natureza em seu esplendor e o saudosismo que faz embevecer o espírito colocam-se por instantes. O sentimento teria sido preservado se não se substituísse notadamente o “sabiá”: “Minha terra tem palmeiras/ onde canta o tico-tico.” O atrevi­mento e a malícia que se associam ao “tico-tico” passam a habitar natu­ralmente a imagem do “sabiá”; e vice-versa, a amabilidade que define o sabiá marca o comportamento do “tico-tico”. O “sabiá” torna-se uma ave de rapina: “vive comendo o meu fubá”.
Alude-se aqui ao choro de Zequinha de Abreu Tico-tico no fubá. Cacaso mostra-se consciente do alcance dessa parodia no momento em que mescla com precisão o saudosismo do poema romântico à ludicidade da canção. A troca das aves reforça os traços de cada um dos elementos em jogo. Acontece que com isso se invalida aquela nostalgia da abertura. A inocência, não por acaso, se esvai e, nesse escoar, cede a vez a uma visão de mundo que se mostra menos cândida e mais analítica sobre o território nacional. Basta ler com atenção a segunda estrofe para se notar o olhar de reprovação com relação ao desenvolvimento do Brasil e espe­cialmente ao “milagre econômico”, que parecia ser mesmo uma bênção: “a água já não vira vinho/ vira direto vinagre”.
Associa-se o avanço da economia ao relato bíblico, sinal com o qual Jesus revelou-se como o cordeiro de Deus a ser sacrificado para salvar os homens. Se o intuito não é necessariamente expressar o grau de falsidade do “milagre econômico” (os historiadores se encarregaram de examinar em detalhes as contradições que o constituíam), associar ao milagre o relato bíblico ajuda a escancarar a virulência da moderni­zação. A velocidade do processo é tamanha que se converte a “água” em “vinagre”. O Messias daqui não veio redimir o indivíduo, livrando-o de seus pecados, mas, sim, submetê-lo ao consumo, ao jogo de interesses, ao Deus dinheiro, etc. O poeta retira da modernização o brilho, a áurea de felicidade e a sensação de bem-estar que a ela se associam para cativar o indivíduo e prendê-lo em sua rede. A exclusão de tais mecanismos de persuasão faz sobressair o produto da modernização em curso: a agres­sividade de suas ações.
Havíamos visto em Canto do regresso à pátria, de Oswald de An­drade, uma mudança que extraiu do Brasil majestoso o custo desta ma­jestade: “Minha terra tem palmares”. A sacada do poeta modernista foi bem aproveitada em Jogos florais. Cacaso amplia o alcance dessa modi­ficação, escrevendo em maiúsculo, para surtir ainda mais efeito, o que antes vinha meio acanhado: “Minha terra tem Palmares”.
A falta de liberdade de expressão é também a perda da Liberdade. O fato de se recordar, em plena ditadura militar, do ambiente onde os negros escravizados refugiavam-se para se livrar do jugo dos senhores de escravo é bem sintomático da condição dos núcleos de resistência ao longo do regime militar. Os membros da guerrilha urbana são também fugitivos. E os órgãos de vigilância corresponderiam mutatis mutandis aos capitães do mato de outros tempos. Dois momentos históricos se cruzam e, ainda que exijam dois modos de avaliar o tema da opressão, levando-se em conta todas as diferenças que os individualizam, há que se considerar, no entanto, o ambiente de opressão, o clima de terror que autoriza uma associação como esta, favorecendo, então, o confronto de dois períodos da história brasileira. É uma relação que vem a calhar. Ou viria, não fosse por certo o temor de ser um dia, quem sabe, uma das vítimas da repressão: “memória cala-te já.”
O receio de se expor em demasia reflete o cotidiano de quem se sente mesmo intimidado pelos acontecimentos e deles não consegue se desvincular a fim de lutar ao menos contra si mesmo. Os versos finais da primeira estrofe ensaiam uma reação que parece acentuar esse sentimen­to, pois, em se tratando de atenuar o que se disse até o momento, se produz uma cortina de fumaça: “Peço licença poética/ Belém capital Pará”.
A saída do poeta é fazer do verso “memória cala-te já” uma rima com “Belém capital Pará”, que, diferentemente do que se constata no Poema de sete faces, “Mundo mundo vasto mundo,/ se eu me chamasse Raimundo/ seria uma rima, não seria uma solução”, é uma solução em Jogos florais. Assim como ajuda a despistar também o disfarce da em­briaguez: “dado o avançado da hora/ errata e efeitos do vinho”
A fonte de referência parece ser de novo Carlos Drummond de Andrade: “mas essa lua/ mas esse conhaque/ botam a gente comovido como o diabo.” A bebida pode mudar, mas não muda, porém, a força do álcool e sua capacidade de alterar o eixo do indivíduo, que fica mais “co­movido” e mais falante do que deveria, deixando escapar naturalmen­te o que há muito está reprimido. Esse efeito do álcool se adequa bem aos movimentos da paródia: “a cavaleiro entre a razão desmistificado­ra (enquanto analisa e ironiza formas alienadas de dizer) e a pura vio­lência do instinto de morte,” que não reconhece barreiras. Ainda que se tenha silenciado a “memória”, e o “vinho” sirva de desculpa, o dedo  continua em riste, mesmo em pensamento, como traz ao final Jogos flo­rais, que anuncia, pelo avesso, os problemas do Brasil. A bola da vez é o oponente Jarbas Passarinho, ex-ministro da Educação. A pilhéria com seu sobrenome – “(será mesmo com esses/que se escreve paçarinho?)” – é uma maneira de alertar sobre as deficiências do ensino público. Ao inserir tais versos no poema Cacaso reinicia um discurso que parecia ter sido encerrado, e sua irreverência, mais uma vez, volta a servir de recurso para abordar o cotidiano e seus impasses.
Compositores também escreveram releituras da Canção do Exílio. Na MPB, o exemplo mais conhecido é a canção "Sabiá", composta por Tom Jobim e Chico Buarque. A música foi composta pelo Tom, intitulada, a princípio, Gávea. Recebeu, em seguida, a letra de Chico Buarque e passou a se chamar Sabiá.
Apresentada no III Festival Internacional da Canção, em 1968, recebeu uma sonora vaia no Maracanãzinho já que concorria com “Prá não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, a preferida pelo público. Foi taxada de alienada e desvinculada da realidade nacional por alguns e de nova “Canção do Exílio” por outros. Apesar de toda rejeição e polêmica, acabou sendo premiada.
Por ironia, no final do mesmo ano, os militares baixaram o AI-5 e fecharam o Congresso. Chico Buarque se viu pressionado a deixar o país. e o sabiá e a palmeira passaram a ser símbolos, também, do exílio político.

Sabiá

Vou voltar!
Sei que ainda vou voltar
Para o meu lugar
Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir
Cantar uma Sabiá...

Vou voltar!
Sei que ainda vou voltar
Vou deitar à sombra
De uma palmeira que já não há
Colher a flor que já não dá
E algum amor
Talvez possa espantar
As noites que eu não queria
E anunciar o dia...

Vou voltar!
Sei que ainda vou voltar
Não vai ser em vão
Que fiz tantos planos
De me enganar
Como fiz enganos
De me encontrar
Como fiz estradas
De me perder
Fiz de tudo e nada
De te esquecer...

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
E é pra ficar
Sei que o amor existe
Não sou mais triste
E a nova vida já vai chegar
E a solidão vai se acabar...
E a solidão vai se acabar...
A referência ao sabiá e à palmeira já nos remete à Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, mas de uma forma mais triste, melancólica como que para mostrar que essa volta é impossível.
No reconhecimento de uma pátria esvaziada e sem perspectiva de modificação próxima, Chico usa a negação do símbolo palmeira:

"Vou deitar à sombra
de uma palmeira que já não há
Colher a flor que já não dá"

Na música “Sabiá”, de Tom Jobim e Chico Buarque, os valores de sua terra foram destruídos, mas o “eu” poético tem esperança de voltar e encontrar um novo tempo capaz de modificar a realidade destruída. Durante toda a canção aparece a dualidade entre o desejo que se queria real e a realidade que se tem:

“ Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir cantar
Uma sabiá.”
Como numa visão premonitória baseada pela situação do país, o autor da letra percebia a solidão das noites de exílio que iria viver longe das palmeiras e sabiás:

“As noites que eu não queria
E anuncia o dia.”
Mesmo existindo o sentimento de perda, existencial e político, durante toda a música ainda há o desejo do regresso para o lugar de paz – a pátria. Se na Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, a pátria corresponde a um lugar de prazer, na música Sabiá essa pátria foi desfigurada principalmente na sua essência. O exílio é de todos. O regresso, então, seria a volta a uma realidade diferente do regime militar vigente na época:

“Vou voltar!
Sei que ainda vou voltar
Para o meu lugar
Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir
Cantar uma Sabiá”
A esperança do regresso é viva e a saudade tem um sentido social: a recuperação da pátria perdida.
Carlos Drummond de Andrade também escreve a sua Nova canção do exílio, em 1945, que é dedicada a Josué Montello. Das diferentes leituras do poema Canção do Exílio que possibilitam o conhecimento da nossa pátria ao mesmo tempo em que nos reconhecemos como parte dela, é meu preferido.
Drummond, mais filosófico, reflete, em seu poema, sobre a distância da felicidade existente na sua terra natal e não tem o tom crítico de Oswald de Andrade e Murilo Mendes.
O poeta, em sua releitura, retoma a imagem do sabiá e da palmeira para idealizar um lugar indeterminado. Na construção “um sabiá, na palmeira, longe” percebe-se a indeterminação – de qual sabiá? Em que palmeira? Longe onde? Como sabiá e palmeira já estão plantados na imaginação do leitor, ele apenas os enuncia.
No final do poema, o poeta inverte a posição do sabiá/palmeira e, além de determinar “a palmeira, o sabiá”, através do uso do artigo definido, substantiva o advérbio “longe”, reforçando a ideia de exílio: o “longe”, lugar de onde veio. Esse afastamento constitui o seu exílio.
Drummond vai além do nacionalismo, discute sobre os lugares míticos que criamos na imaginação, em geral associados à terra natal: "onde tudo é belo / e fantástico: / a palmeira, o sabiá, / o longe".

Nova Canção do Exílio

Um sabiá
na palmeira, longe.

Estas aves cantam
um outro canto.

O céu cintila
sobre flores úmidas.
Vozes na mata,
e o maior amor.

Só, na noite,
seria feliz:
um sabiá,
na palmeira, longe.

Onde tudo é belo
e fantástico,
só, na noite,
seria feliz.
(Um sabiá,
na palmeira, longe.)

Ainda um grito de vida e
voltar
para onde tudo é belo
e fantástico:
a palmeira, o sabiá,
o longe.

(Carlos Drummond de Andrade)
O sucesso alcançado pelo poema Canção do Exílio de Gonçalves Dias tornou-se o grande paradigma do nacionalismo literário no Brasil. Vários poetas, posteriores a Gonçalves Dias, seguiram a mesma linha explicitando um olhar otimista e, ao mesmo tempo, saudoso sobre o país.
Casimiro de Abreu, contemporâneo de Gonçalves Dias, usa a mesma temática em alguns de seus poemas.

Em 1855, Casimiro de Abreu também escreveu uma canção do exílio:

Eu nasci além dos mares

Eu nasci além dos mares:
Os meus lares,
Meus amores ficam lá!
― Onde canta nos retiros
Seus suspiros,
Suspiros o sabiá!

Oh! Que céu, que terra aquela,
Rica e bela
Como o céu de claro anil!
Que seiva, que luz, que galas,
Não exalas,
Não exalas, meu Brasil!

Oh! Que saudades tamanhas
Das montanhas,
Daqueles campos natais!
Que se mira,
Que se mira nos cristais!

Não amo a terra do exílio
Sou bom filho,
Quero a pátria, o meu país,
Quero a terra das mangueiras
E as palmeiras
E as palmeiras tão gentis!

Como a ave dos palmares
Pelos ares
Fugindo do caçador;
Eu vivo longe do ninho;
Sem carinho
Sem carinho e sem amor!

Debalde eu olho e procuro...
Tudo escuro
Só vejo em roda de mim!
Falta a luz do lar paterno
Doce e terno,
Doce e terno para mim.

Distante do solo amado
― Desterrado ―
a vida não é feliz.
Nessa eterna primavera
Quem me dera,
Quem me dera o meu país!
(Casimiro de Abreu)

Em outro poema, datado de 1856, Casimiro de Abreu usa como epígrafe os dois primeiros versos do poema de Gonçalves Dias, mostrando as qualidades que existem amplamente no Brasil por ser a “minha terra” e que não existem em qualquer outro lugar.

Minha Terra

Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá.
(Gonçalves Dias)

Todos cantam sua terra,
Também vou cantar a minha,
Nas débeis cordas da lira
Hei de fazê-la minha rainha;

— Hei de dar-lhe a realeza
Nesse trono de beleza
Em que a mão da natureza
Esmerou-se em quanto tinha.

Correi pras bandas do sul:
Debaixo dum céu de anil
Encontrareis o gigante
Santa Cruz, hoje Brasil;
— É uma terra de amores
Alcatifada de flores
Onde a brisa fala amores
Nas belas tardes de Abril.

Tem tantas belezas, tantas,
A minha terra natal.
Que nem as sonha um poeta
E nem as canta um mortal!
— É uma terra encantada
— Mimoso jardim de fada —
Do mundo todo invejada,
Que o mundo não tem igual.

Não, não tem, que Deus fadou-a
Dentre todas — a primeira:
Deu-lhe esses campos bordados,
Deu-lhe os leques das palmeiras.
E a borboleta que adeja.
Sobre as flores que ela beija.
Quando o vento rumoreja
Nas folhagens da mangueira.

É um país majestoso
Essa terra de Tupã,
Desd’o Amazonas ao Prata,
Do Rio Grande ao Pará!
— Tem serranias gigantes
E tem bosques verdejantes
Que repetem incessantes
Os cantos do sabiá.
(...)
(Casimiro de Abreu)

Em sua “Canção do Exílio” continua seguindo a mesma temática, apenas acrescentando ao poema uma referência à sua infância, à figura materna e substituindo “palmeiras” por “laranjeiras”.
Essa “Canção do Exílio” foi escrita em Lisboa, no ano de 1857. O poema soa como uma premonição de um desejo que na verdade se realizou, já que morreu aos 21 anos de idade, em terras brasileiras.

Canção do Exílio

Se eu tenho que morrer na flor dos anos
Meu Deus! não seja já:
Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,
Cantar o sabiá!

Meu Deus, eu sinto e tu bem vês que eu morro
Respirando êste ar;
Faz que eu viva, Senhor! dá-me de novo
Os gozos do meu lar!

O país estrangeiro mais belezas
Do que a pátria não tem;
E este mundo não vale um só de beijos
Tão doces de uma mãe!

Dá-me os sítios gentis onde eu brincava
Lá na quadra infantil;
Dá que eu veja uma vez o céu da pátria,
O céu do meu Brasil!

Se eu tenho de morrer na flor dos anos
Meu Deus! não seja já:
Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,
Cantar o sabiá!
(Casimiro de Abreu)


O modernista Murilo Mendes, em 1930, também revisitou a Canção do Exílio de Gonçalves Dias. Se o poema de Gonçalves Dias e o Hino Nacional são uma exaltação ufanista da natureza brasileira, os versos de Murilo Mendes tem intenção oposta, pois pretendem ridicularizar esse nacionalismo exaltado.
Murilo escreve sua "Canção do Exílio", empregando o mesmo tom paródico-piadista de Oswald de Andrade. Em sua “Canção do Exílio”, utiliza o mesmo humor e sátira de Oswald, porém de forma mais ousada denuncia a invasão cultural estrangeira no Brasil. Seu poema critica a realidade cultural brasileira. Ele não aceita tudo o que vêm de fora já que também temos coisas boas que devem ser valorizadas. As nossas frutas, como são exportadas, tem o preço elevado e o poeta é um exilado em sua própria terra.
Sua terra se torna verdadeiramente seu Brasil, quando manifesta a vontade de “chupar uma carambola de verdade” e de ouvir um sabiá (pássaro ou povo), que tenha certidão de nascimento brasileira, cantar.

Canção do Exílio

Minha terra tem macieiras da Califórnia
onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas.
Os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda.
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossa flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil-réis a dúzia.

Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá com certidão de identidade!
(Murilo Mendes)



Um comentário:

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